CDH identifica precariedade sanitária na Papuda

Em diligência realizada ontem (1º), foi constatada falta de higienização e de insumos para proteção dos apenados; famílias também relataram total ausência de notícias sobre os detentos

O cenário encontrado ontem (1º) no complexo penitenciário da Papuda é desolador. Falta de higienização das alas, superlotação nas celas e até limpeza dos blocos com creolina são alguns dos problemas listados na diligência realizada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa (CDH). Familiares também relataram que estão há meses sem qualquer tipo de informação sobre os presos; muitos dos quais contraíram Covid e os parentes sequer sabem como está o quadro clínico dos internos.

A fiscalização foi motivada pelos mais de 300 relatos registrados na Central de violação de direitos durante a pandemia do novo coronavírus, instaurada no âmbito da CDH. “O cenário que encontramos lá é de total precariedade. Vi muita sujeira, falta de sabão e álcool gel para os detentos, além de relatos sobre falta de testagem em pessoas com sintomas da Covid e até comida estragada servida aos presos”, relata o presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Distrital Fábio Felix (PSOL).

4 mil presos onde só cabem 1.500

Fábio Felix visitou os Blocos D e F do PDF1, primeira ala da Papuda a registrar casos da Covid-19. “A situação é gravíssima: celas projetadas para duas pessoas, contabilizam 13 presos. Onde deveriam alojar oito pessoas, colocaram mais de 30. Foi nessa ala que começou o surto de contaminação no complexo. Se nada for feito, teremos certamente novas ondas de infecção”, salienta.

O presidente da CDH também relata ter sentido cheiro de creolina no Bloco F. “Será que essa é a forma adequada de higienizar o local? Vamos fazer esse questionamento”, afirma o parlamentar. Na visão do deputado, a liberação de presos que já podem progredir de regime e a concessão de prisão humanitária e domiciliar a idosos e demais pessoas do grupo de risco ajudariam a minimizar a superlotação da Papuda durante a vigência da pandemia.

Comitiva proibida de entrar e de tirar fotos

Além de Fábio Felix, Marcelo Santos, da Comissão de Saúde da OAB, Tiago Pessoa, do Conselho Regional de Enfermagem, e Will Ribeiro, do Conselho de Saúde do DF, participariam da diligência. Os representantes dos órgãos de controle foram impedidos de participar da vistoria. “Vim aqui conversar com os profissionais de saúde para entender se os protocolos sanitários estão sendo seguidos, mas fui impedido de exercer a minha função”, declara o representante do Coren. “Ao negar o meu acesso, fiquei impossibilitado de checar se as testagens correspondem aos dados divulgados pela Vara de Execuções Penais (VEP) e pelo GDF”, alerta Will Ribeiro.

O parlamentar do PSOL também foi proibido de tirar fotos das irregularidades encontradas.  “O meu pedido foi para registrar as condições de higiene do complexo e não expor qualquer estrutura estratégica que gerasse fragilidade na segurança. Esse pedido me foi negado, conforme assinado pelo próprio Diretor do presídio. Houve cerceamento da prerrogativa parlamentar de fiscalização e equanto presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa não posso aceitar tal arbitrariedade”, alega o parlamentar em comunicado à imprensa.

Relatos chocantes

A falta de informações é o que mais angústia as famílias dos presos. A comitiva registrou relatos de familiares que estão há meses sem saber se seus entes estão saudáveis e seguros. A família de um dos detentos relatou que entregou o conjunto de mantimentos para o preso em abril, mas ele só recebeu no fim de junho. A Mãe de outro interno contou que ele teve Covid e que ela ficou dois meses sem informações do filho. “Só ontem consegui porque paguei um advogado. Meu filho Nunca foi atendido por nenhum médico, mas consta como visitado em um relatório. Exijo justiça”, desabafa”.

A Irmã de outro detento relata que ele foi transferido com Covid pro CDP2 e “não tinha nem coberta para se proteger do frio e dos calafrios. Ele foi transferido para a ala isolada do presídio, mas está em uma cela com mais de 20 pessoas, sendo que cabem só oito”.

A esposa de um interno afirma que ele está com a perna quebrada e “atrofiando já, totalmente negligenciado. Alegam para a gente que a Covid está impedindo o tratamento adequado, porque ele não pode ser deslocado para um hospital”. Outros familiares contaram que estão há dois, três e até quatro meses sem qualquer notícia. Os relatos constarão no relatório final da diligência, que será enviado para a VEP, para a Secretaria do Sistema Penitenciário do DF e para o Ministério Público para providências.

Familiares se concentram na entrada do Complexo Penitenciário da Papuda

NOTA – VEP impede registro fotográfico na Papuda

O papel fiscalizatório que tenho obrigação de desempenhar enquanto parlamentar e presidente da Comissão de Direitos Humanos foi prejudicado a partir do momento em que fui desautorizado a registrar as condições encontradas. O Artigo 28 da Portaria da própria Vara de Execuções Penais autoriza esse registro com a finalidade de apurar denúncias. Só nos últimos dois meses, recebemos mais de 300 denúncias de falhas no sistemas prisional em tempos de pandemia. No processo democrático as políticas públicas gestores precisam ser fiscalizadas. Cabe registrar que fui recebido com respeito pela diretoria da Unidade Prisional e pelo secretário da Subsecretaria do Sistema Penitenciário do DF.

Não podemos nos furtar de falar a verdade ao sair de uma diligência, sobretudo quando violações de direitos e descumprimento dos protocolos sanitários são constatados. O meu pedido foi para registrar as condições de higiene do complexo e não expor qualquer estrutura estratégica que gerasse fragilidade na segurança. Esse pedido me foi negado, conforme assinado pelo próprio Diretor do presídio. Houve cerceamento da prerrogativa parlamentar de fiscalização e equanto presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa não posso aceitar tal arbitrariedade.O posicionamento da VEP é uma resposta desproporcional. A proibição de registro precariza o controle social de qualquer estabelecimento público e expõe a sociedade à desinformação. Buscaremos o foro adequado para defender nossas prerrogativas constitucionais e políticas.

Fábio Felix, deputado Distrital e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa